cultura (arte, ciência, política, ética e filosofia) é o principal campo onde é possível trabalhar diferenças, limitações e dificuldades, especialmente nas instituições escolares com alunos portadores de necessidades especiais e determinada orientação sexual, raça, gênero, idade e religião, pois devemos evidenciar que estamos educando um ser humano. Na educação inclusiva, a intersecção entre educação, arte e psicologia, sob a perspectiva teórica da psicologia histórico-cultural, é fundamental considerar a inserção da cultura na educação formal de todos os indivíduos, uma vez que é o universo cultural que torna possível o desenvolvimento biológico a partir da apropriação dos bens culturais que a humanidade produziu ao longo dos anos em suas diversas práticas sociais. Ou seja, é dessa maneira que o indivíduo torna-se humano. Frente a essas colocações, nos perguntamos: O que é educação inclusiva? É possível ensinar arte nesta perspectiva? De que forma? Como capacitar professores de acordo com esta proposta? E é possível passar de uma existência biológica para uma existência histórico-social? De que maneira?
A educação inclusiva propõe uma educação de qualidade para todos, com aceitação, convivência e valorização das diferenças e escolhas individuais, assim como dos modos e tempos de aprendizagem destes sujeitos. Na concepção de "todos" também se incluem: portadores de necessidades especiais e pessoas com diferentes orientações sexuais, raças, gêneros, idades e religião. No entanto, estudiosos da área advogam que é preciso acreditar na crença de que todas as pessoas são capazes de aprender, independente da raça e da religião a que pertençam, bem como de sua opção sexual, seu gênero, sua idade e suas necessidades especiais.
Muitas vezes ao focar nas diferenças individuais tenta-se ocultar a presença de outro elemento: das desigualdades sócio-culturais presentes na instituição escolar. Na área da psicologia há diversos estudos sobre fracasso escolar e carência cultural realizados com a intenção de nivelar ou suprir inadequações, deficiências ou dificuldades de alunos de classes sociais menos favorecidas, o que culminou na idéia de determinismo cultural. Outro exemplo está na inserção da psicologia no contexto escolar, em especial na década de 1980, na qual as práticas psicológicas estavam pautadas no atendimento clínico e individual, e envolviam o uso do psicodiagnósticos e da organização de classes para alunos especiais". Ou seja, o modelo de trabalho adotado era o clínico (médico) e o psicométrico (testagens), numa perspectiva individualista e focada em apontar os alunos como "problemáticos", e não como seres humanos e em processo de desenvolvimento. Neste contexto, a escola tornou-se mais um instrumento de discriminação e exclusão social.
Hoje, para superar e ir além destes fatos históricos acima relatados brevemente, muitas vezes torna-se necessário as seguintes adaptações: o apoio adicional de profissionais de outras áreas do conhecimento (psicologia, teologia, fisioterapia, direito e biologia, entre outras); materiais, técnicas, procedimentos e instrumentos do trabalho educativo, pedagógico e artístico específicos; modificações físicas e ambientais nas salas de aula e nas escolas; e a condução assertiva de diversas questões pessoais e sociais no contexto escolar para que ocorra o processo formal de escolarização, bem como o respeito à dignidade humana dos sujeitos que estão inseridos nas diferentes práticas escolares. Estas adequações buscam efetivar uma proposta curricular no sentido do reconhecimento das diferenças, sua aceitação e na tentativa de superação das limitações e dificuldades, e não na negação destas. Aqui cabe ressaltar que não se trata de modificar o currículo escolar nem abdicar de conteúdos escolares e artísticos, tampouco do processo de avaliação, mas sim de efetivar o papel social que compete à escola, a de transmitir e produzir conhecimentos para todos os alunos.
Nesta direção, há uma crescente demanda por professores e profissionais da área da educação e das artes capacitados para atuar na educação inclusiva, uma vez que estes, além de suas funções específicas, também necessitam trabalhar com os conflitos, tensões e contradições individuais e sociais oriundas destas especificidades. A capacitação destes educadores inicia-se com uma sólida formação acadêmica e prolonga-se na formação continuada, rumo a uma constante instrumentalização prática e reconstrução teórica, que sejam capazes de desfazer idealizações niveladoras por meio da apropriação cultural e da superação dos componentes biológicos. E é esta uma das possibilidades que a educação inclusiva busca para efetivar uma educação escolar e artística de qualidade e para todos.
Em relação ao ensino da arte são necessárias as seguintes condições, além das acima explanadas: espaço físico e materiais adequados e variados às atividades artísticas e de acordo com a linguagem artística a ser trabalhada (música, teatro, danças e artes visuais). Também é no trabalho artístico que a humanização do Homem implica-o em deixar de ser apenas espécie biológica (funções psicológicas elementares - linha natural: conhecimento sensorial imediato, como o comportamento instintivo e reflexo) e assumir características culturais. Isso acontece por meio da formação dos processos psicológicos superiores, ou ainda, funções corticais superiores, funções psíquicas superiores e funções culturais - linha cultural (linguagem, pensamento, sentimento, cognição, memória, percepção, atenção, planejamento e abstração e criação e aquisição de diferentes instrumentos), que diferencia o Homem dos demais animais. Este processo só pode ocorrer nas interações sociais e entre os homens.
Assim sendo, a escola em conjunto com docentes e profissionais da educação e da área de arte precisa propiciar a todos os discentes espaços sociais e tempo para desenvolver atividades escolares e artísticas que sejam capazes de promover intervenções humanas (mediações) no sentido de superar a herança genética e o determinismo ambiental (aspectos biológicos) para construção da aprendizagem e posterior desenvolvimento humano, conforme as condições sociais e culturais presentes.
Desta forma, a educação inclusiva e o ensino da arte têm como principal desafio acolher todos os alunos e oferecer a eles as mesmas oportunidades educacionais e artísticas, promovendo o processo ensino-aprendizagem, além de também trabalhar com as diferenças, dificuldades e limitações individuais nas suas mais diversas relações no interior da instituição escolar. Para que isso se efetive é necessário abandonar as idéias inatistas e as teorias evolucionistas e genéticas, que acreditam na concepção imutável, pronta e acabada do Homem, da sociedade e da educação.
Para tornar-se ser humano, o Homem depende do que ele apreendeu do universo cultural e social no qual se insere e de como o utiliza em sua vida. O Homem não é somente mais um animal na escala evolutiva da biologia, mas também um ser capaz de adequar-se, superar-se e modificar suas condições de vida. Para isso ele conta com uma vasta gama de experiências de gerações anteriores, as quais não são transmitidas geneticamente, e que denominamos de experiências histórica e cultural, as quais estão registrada nas produções artísticas, científicas, políticas, éticas e filosóficas construídas por outros Homens nas mais diversas sociedades e tempos históricos.
Referências Bibliográficas
RAMOS, R., Passos para a inclusão. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2006.
LEONTIEV, A., O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Horizonte Universitário, 1978.
VIGOTISKI, L. S., Psicologia da arte. 1ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
WERNECK, C., Ninguém mais vai ser bonzinho na sociedade inclusiva. Rio de Janeiro: Editora WVA, 1997.
Christiane Denardi
É psicóloga, pianista, pesquisadora e professora de música e ensino superior. Mestre em Educação pela PUC-PR, Especialista em Magistério do Ensino Superior e Psicologia Organizacional e do Trabalho pela PUC-PR e em Educação Musical pela EMBAP. Possui diversos trabalhos publicados, além de ministrar palestras, oficinas e consultoria nas áreas de Educação, Psicologia e Arte. É colaboradora em revistas e sites educacionais.
Fonte: www.editoraopet.com.br
De tudo um pouco: resenhas; atividades escolares para o Ensino Fundamental I e II, Educação Infantil, Alfabetização; Jogos; Dicas; Atividades, Planos e projetos de aula, Textos teóricos; Artesanato; Redação; Enem; Vestibular; Revistas; Artigos; Moldes; Reciclagem...
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segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011
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professores apaixonados
Professores e professoras apaixonadas acordam cedo e dormem tarde, movidos pela idéia fixa de que podem mover o mundo.
Apaixonados, esquecem a hora do almoço e do jantar: estão preocupados com as múltiplas fomes que, de múltiplas formas, debilitam as inteligências.
As professoras apaixonadas descobriram que há homens no magistério igualmente apaixonados pela arte de ensinar, que é a arte de dar contexto a todos os textos.
Não há pretextos que justifiquem, para os professores apaixonados, um grau a menos de paixão, e não vai nisso nem um pouco de romantismo barato.
Apaixonar-se sai caro! Os professores apaixonados, com ou sem carro, buzinam o silêncio comodista, dão carona para os alunos que moram mais longe do conhecimento, saem cantando o pneu da alegria.
Se estão apaixonados, e estão, fazem da sala de aula um espaço de cânticos, de ênfases, de sínteses que demonstram, pela via do contraste, o absurdo que é viver sem paixão, ensinar sem paixão.
Dá pena, dá compaixão ver o professor desapaixonado, sonhando acordado com a aposentadoria, contando nos dedos os dias que faltam para as suas férias, catando no calendário os próximos feriados.
Os professores apaixonados muito bem sabem das dificuldades, do desrespeito, das injustiças, até mesmo dos horrores que há na profissão. Mas o professor apaixonado não deixa de professar, e seu protesto é continuar amando apaixonadamente.
Continuar amando é não perder a fé, palavra pequena que não se dilui no café ralo, não foge pelo ralo, não se apaga como um traço de giz no quadro.
Ter fé impede que o medo esmague o amor, que as alienações antigas e novas substituam a lúcida esperança.
Dar aula não é contar piada, mas quem dá aula sem humor não está com nada, ensinar é uma forma de oração.
Não essa oração chacoalhar de palavras sem sentido, com voz melosa ou ríspida. Mera oração subordinada, e mais nada.
Os professores apaixonados querem tudo. Querem multiplicar o tempo, somar esforços, dividir os problemas para solucioná-los. Querem analisar a química da realidade. Querem traçar o mapa de inusitados tesouros.
Os olhos dos professores apaixonados brilham quando, no meio de uma explicação, percebem o sorriso do aluno que entendeu algo que ele mesmo, professor, não esperava explicar.
A paixão é inexplicável, bem sei. Mas é também indisfarçável.
* Gabriel Perissé é Mestre em Literatura Brasileira pela FFLCH-USP e doutor em Filosofia da Educação e doutorando em Pedagogia pela USP; é autor dos livros "Ler, pensar e escrever" (Ed. Arte e Ciência); "O leitor criativo" (Omega Editora); "Palavra e origens" (Editora Mandruvá); "O professor do futuro (Thex Editora). É Fundador da ONG Projeto Literário Mosaico ; É editor da Revista Internacional Videtur -Letras (www.hottopos.com/vdletras3/index.htm); é professor universitário, coordenador-geral da ong literária Projeto Literário Mosaico: www.escoladeescritores.org.br)
Apaixonados, esquecem a hora do almoço e do jantar: estão preocupados com as múltiplas fomes que, de múltiplas formas, debilitam as inteligências.
As professoras apaixonadas descobriram que há homens no magistério igualmente apaixonados pela arte de ensinar, que é a arte de dar contexto a todos os textos.
Não há pretextos que justifiquem, para os professores apaixonados, um grau a menos de paixão, e não vai nisso nem um pouco de romantismo barato.
Apaixonar-se sai caro! Os professores apaixonados, com ou sem carro, buzinam o silêncio comodista, dão carona para os alunos que moram mais longe do conhecimento, saem cantando o pneu da alegria.
Se estão apaixonados, e estão, fazem da sala de aula um espaço de cânticos, de ênfases, de sínteses que demonstram, pela via do contraste, o absurdo que é viver sem paixão, ensinar sem paixão.
Dá pena, dá compaixão ver o professor desapaixonado, sonhando acordado com a aposentadoria, contando nos dedos os dias que faltam para as suas férias, catando no calendário os próximos feriados.
Os professores apaixonados muito bem sabem das dificuldades, do desrespeito, das injustiças, até mesmo dos horrores que há na profissão. Mas o professor apaixonado não deixa de professar, e seu protesto é continuar amando apaixonadamente.
Continuar amando é não perder a fé, palavra pequena que não se dilui no café ralo, não foge pelo ralo, não se apaga como um traço de giz no quadro.
Ter fé impede que o medo esmague o amor, que as alienações antigas e novas substituam a lúcida esperança.
Dar aula não é contar piada, mas quem dá aula sem humor não está com nada, ensinar é uma forma de oração.
Não essa oração chacoalhar de palavras sem sentido, com voz melosa ou ríspida. Mera oração subordinada, e mais nada.
Os professores apaixonados querem tudo. Querem multiplicar o tempo, somar esforços, dividir os problemas para solucioná-los. Querem analisar a química da realidade. Querem traçar o mapa de inusitados tesouros.
Os olhos dos professores apaixonados brilham quando, no meio de uma explicação, percebem o sorriso do aluno que entendeu algo que ele mesmo, professor, não esperava explicar.
A paixão é inexplicável, bem sei. Mas é também indisfarçável.
* Gabriel Perissé é Mestre em Literatura Brasileira pela FFLCH-USP e doutor em Filosofia da Educação e doutorando em Pedagogia pela USP; é autor dos livros "Ler, pensar e escrever" (Ed. Arte e Ciência); "O leitor criativo" (Omega Editora); "Palavra e origens" (Editora Mandruvá); "O professor do futuro (Thex Editora). É Fundador da ONG Projeto Literário Mosaico ; É editor da Revista Internacional Videtur -Letras (www.hottopos.com/vdletras3/index.htm); é professor universitário, coordenador-geral da ong literária Projeto Literário Mosaico: www.escoladeescritores.org.br)