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quarta-feira, 20 de julho de 2011

Relações causais e explicativas no discurso argumentativo

Modalizadores do discurso

Bloco de Conteúdo:Análise e reflexão sobre a língua e a linguagem
Introdução : Há várias formas de organizar as ideias quando queremos expressá-las por meio de um texto, seja ele escrito ou falado. Uma delas é a argumentação. O que caracteriza essa opção é o encadeamento de proposições com o intuito de defender um ponto de vista. Essa articulação pode se dar por meio das chamadas conjunções lógicas, como o “pois” e o “porque”. O efeito de causalidade característico de um texto argumentativo revela a relação entre duas ideias: uma é a causa, outra, a consequência. Conhecer as relações estabelecidas por essas conjunções é um requisito importante para o aluno ampliar sua capacidade de compreender e de produzir textos cada vez melhores.
Neste bloco de aulas, não está em jogo a distinção – difícil até para os gramáticos – entre as orações coordenadas explicativas e as subordinadas adverbiais causais. O interesse aqui incide nas relações causais e explicativas construídas no interior de pequenos trechos.
Objetivos
Analisar as relações causais e explicativas no discurso argumentativo;
Analisar os efeitos de sentido dos usos dos conectivos no discurso argumentativo.
Conteúdo específico
Relações causais no discurso argumentativo.
Uso dos conectivos “pois” e “porque”.
Tempo estimado :6 aulas

Desenovlvimento
1ª etapa
Peça que os alunos leiam o seguinte texto de Walnice Nogueira Galvão. O fragmento encontra-se no livro Guimarães Rosa, no qual a autora analisa o romance Grande Sertão: Veredas, publicado em 1956. Nele, diferentemente dos romances voltados para o Nordeste, o sertão remete aos campos mineiros, ricos em pequenos riachos – as veredas –, em gado solto por pastos a perder de vista e na ética dos jagunços. No trecho, a autora analisa o papel da criação extensiva do gado na economia brasileira.

TEXTO PARA LEITURA
A presença difusa e constante do bovino, em Grande Sertão: Veredas, recria o universo da pecuária extensiva, onde o gado é criado solto e não estabulado. A origem dessa maneira de criar gado remonta aos tempos coloniais, quando a atividade econômica prioritária se resumia às plantações às quais se reservavam as terras mais férteis e mais próximas do litoral, para minimizar os custos do envio da mercadoria para a metrópole. Espécie de parente pobre da economia colonial, a criação de gado dispensava investimentos e se contentava com um mínimo de mão-de-obra. Era, todavia, indispensável, pois alimentava todos aqueles envolvidos na agroindústria, primeiro da cana-de-açúcar e mais tarde de café. Socialmente, era uma atividade atraente, pois reservava-se aos homens livres, porque os distinguia do trabalho manual dos escravos.
GALVÃO, W. N. Guimarães Rosa. São Paulo: Publifolha, 2010 (Adaptado).
Depois da leitura, peça que os alunos identifiquem no texto as informações sobre a pecuária extensiva. É provável que o primeiro empecilho da atividade seja o teor do texto. Muitos alunos podem reclamar que o fragmento mais parece indicado à disciplina de História. Caso isso ocorra, discuta com eles o caráter interdisciplinar do conhecimento. Walnice Galvão, no pequeno livro Guimarães Rosa, parte das referências constantes ao gado em Grande Sertão para analisar a presença da pecuária extensiva no Brasil.
Após a realização dos exercícios pelos alunos, inicie junto com eles a análise do texto de Walnice. Leia o texto novamente. Diga aos alunos que ele tem o intuito de expor uma idéia e de analisá-la. Dessa forma, a clareza, a ausência de ambiguidades é um dos seus objetivos.
Inicie a análise, mostrando aos alunos que, mesmo quem não sabia o significado de pecuária extensiva não ficou perdido, pois o seu significado é explicitado no texto – é onde o gado é criado solto e não estabulado. Diga também a eles que o significado de “estabulado” pode ser inferido com base em nossos conhecimentos prévios: “estábulo” indica o lugar onde se prendem os bois, “não estabulado” significa não preso em estábulos.
No segundo período, há novas caracterizações da atividade: são dadas circunstâncias temporais de seu início entre nós – o período colonial – e se insinua a localização e a relação com outras atividades – a pecuária se deu fortemente no interior do país.
Os três períodos subsequentes trazem afirmações a respeito da pecuária extensiva e as explicam em seguida. A primeira diz que ela era uma prima pobre das outras atividades econômicas coloniais – dispensava investimentos e requisitava pouca mão-de-obra. Essa explicação, ao contrário dos dois próximos períodos, não possui um conectivo explícito.
Continue a análise e assinale a presença da conjunção “pois”. As duas ocorrências marcam relações explicativas – a pecuária era indispensável, pois alimentava os envolvidos na atividade da agroindústria; ela era socialmente interessante, pois reservava-se aos homens livres e os distinguia dos escravos.
Para finalizar a análise, você pode dizer aos alunos que o texto não revela, mas insinua ideias a respeito da nossa formação socioeconômica. Uma é a relevância atribuída à exportação dos produtos agrícolas, outra é a valorização do trabalho livre.
Como tarefa para casa, solicite aos alunos que pesquisem os usos do conectivo “pois”. Sugira que busquem em dicionários exemplos desses usos e os copiem no caderno.

2ª etapa
-Se você tiver acesso ao livro de Guimarães Rosa, você pode iniciar a aula, mostrando o exemplar aos alunos. Não se trata de indicar a leitura, nesse estágio escolar, mas de permitir a eles o contato inicial com uma referência importante da nossa literatura. A apresentação sucinta do enredo, a leitura de um pequeno trecho e uma informação perspicaz sobre o autor certamente deixarão marcas que poderão incentivar a leitura do romance no futuro.
-Corrija a tarefa proposta. Reforce com os alunos o uso do “pois” como elemento conclusivo e como elemento explicativo. Alguns exemplos:
Ele chegou atrasado, não conseguiu, pois, entrar.
Eu não encontrei a chave, ela não estava, pois, em seu lugar.
Ele não chegou, pois não há ruído na casa.
Ele gostou da exposição, pois a indicou a todos os seus amigos.

-Proponha aos alunos que escrevam um pequeno parágrafo, analisando o texto de Walnice Galvão. Nessa produção, eles devem usar a conjunção “pois” com o sentido de explicação.
-Ouça e comente a produção dos alunos.

3ª etapa
-Leia para os alunos o editorial abaixo, dedicado à água, publicado na Revista da USP, em junho/julho e agosto de 2006.

EDITORIAL
Com este número damos início à trilogia dos quatro elementos (água, terra, ar e fogo). Começamos com "Água" por razões quase óbvias. Se o corpo humano é quase 70% água, talvez essa seja uma ótima razão. Mas não sendo redundante, e não deixando de sê-lo, seria muito bom afirmar o velho bordão de que sem água não há vida. Vamos nos centrar no caso das grandes cidades. Como se daria a convivência de vários milhões de pessoas sem a utilização da água? Os romanos, já no seu tempo, tinham uma noção muito exata disso. E, aqui, cabe uma história divertida envolvendo o poeta Carlos Drummond de Andrade. Lá pelas tantas, vivendo no Rio de Janeiro, o bairro do poeta ficou sem água. O cidadão Drummond, indignado, escreveu uma carta aos jornais denunciando a falta do produto. Algumas pessoas, desavisadas, andaram recriminando publicamente tal fato. Afinal, por que um poeta do seu calibre iria descer do pedestal para reclamar de coisa tão banal? A resposta de Drummond foi de uma ironia que engolia a própria obviedade: "Sem água não posso tomar banho". Com muita propriedade, portanto, podemos dizer que sem água não temos comida na mesa, roupa lavada etc.
Acontece ainda que a questão da água hoje se impõe dado o ritmo alucinante de expansão de algumas cidades. Cansamos de ouvir, ver e ler que estamos com problemas graves de esgoto a céu aberto, de lixo (dos mais variados) contaminando rios e nascentes. Na cidade de São Paulo, por exemplo, convivemos há anos com esta moléstia: a poluição dos rios Tietê e Tamanduateí, que cortam a cidade - isso, para ficarmos apenas nos dois que são os mais visíveis, que ainda não foram enjaulados pela canalização e não deixaram de ser observados por uma população que nem sequer pressente sua presença.
Água é vida. Passamos por um momento em que a questão da água se coloca como problema a ser solucionado a médio prazo. Se isso não for feito, dizem muitos ambientalistas, será o colapso. Assim, convidamos o leitor atento a procurar neste dossiê um texto que lhe agrade, da filosofia à arquitetura - água doce ou salgada. É uma ótima ocasião de se entrar em contato com uma das grandes questões do nosso tempo.
Francisco Costa Texto disponível neste link Acessado em 16 de novembro de 2010.

-Após a leitura, pergunte aos alunos qual o objetivo do texto. Ouça-os e reitere o caráter de apresentação do tema analisado no dossiê e das razões que levaram a essa escolha.
-Em seguida, peça aos alunos que releiam o texto e identifiquem o uso de uma palavra com valor conclusivo que possa ser substituída pela conjunção “pois”, com esse valor. Veja se identificaram a conjunção conclusiva “portanto” no trecho Com muita propriedade, portanto, podemos dizer que sem água não temos comida na mesa, roupa lavada etc.
-Assinale aos alunos que a conjunção “pois” insere-se entre duas vírgulas quando possui valor de conclusão. Já quando possui valor explicativo, a vírgula a antecede.
-Proponha aos alunos que escrevam um parágrafo apresentando, segundo as ideias do editorial, as razões que levaram à escolha do tema da revista. Nesse parágrafo, eles devem usar a conjunção “porque” com o valor de causa.

4ª etapa
-Escreva no quadro o seguinte texto e leia-o em voz alta para os alunos.

TEXTO PARA LEITURA
Como os jovens delinquentes receberam muito mais trocas agressivas com o mundo exterior (família) do que amorosas, aprendem a conseguir a realização de suas necessidades mediante a violência ou força. Na medida em que crescem, cada vez que desejam algo, buscam obter o que sentiam como necessidade por meio dos furtos, roubos, estupros, homicídios, uso de tóxicos etc., o que, por sua vez, evidencia sua indiferenciação entre o eu e o não-eu e uma defesa compulsiva contra o profundo sentimento de privação. Ao enfrentar a crise da adolescência, onde tanto os impulsos agressivos como os libidinais estão exacerbados, estes menores não encontram um ambiente capaz de abarcar seus desequilíbrios momentâneos, o que favorece, mais uma vez, o aparecimento de atuações criminosas, muitas vezes, irreversíveis.
Acessado em 16 de novembro de 2010.

-Solicite que, em duplas, os alunos reflitam sobre o texto e expliquem, por meio de um pequeno texto, os mecanismos utilizados em sua construção. Discuta as respostas dos alunos. Nesse momento, mostre como o texto acima parte de uma afirmação tomada como verdade e causa da violência – os jovens delinqüentes receberam muito mais trocas agressivas com o mundo exterior (família) do que amorosas. Ou seja, devido a essa causa eles aprendem a conseguir a realização de suas necessidades mediante a violência ou força. Essa consequência atua como causa de outra cadeia, gerando outra consequência, pois esses jovens, quando crescem, cada vez que desejam algo, buscam obter o que sentiam como necessidade por meio dos furtos, roubos, estupros, homicídios, uso de tóxicos etc.
-Solicite aos alunos que reescrevam o primeiro período do texto, invertendo a ordem causa-consequência e utilizando a conjunção “porque”. Uma possibilidade de reescrita é:
Os jovens delinquentes aprenderam a realizar suas necessidades por meio da violência porque receberam mais trocas agressivas com o mundo exterior que amorosas.

-Discuta com os alunos a diferença de sentido das duas construções. A anteposição da causa, como ocorre no texto original, sugere um fato conhecido e aceito pelo interlocutor. A anteposição da consequência atenua o caráter persuasivo da construção causal.
-Após a correção da atividade, proponha a eles que, em dupla, busquem conjunções ou locuções conjuntivas que estabeleçam relações de causa e consequência e reescrevam o trecho acima utilizando uma dessas formas. A tarefa deve ser iniciada em classe e concluída em casa.

5ª etapa
-Realize a correção da tarefa proposta na aula passada. Entre as possibilidades de conjunções encontramos: pois, já que, uma vez que, dado que, visto que. Em seguida, apresente à turma o texto Brinquedos, de Roland Barthes. O texto foi escrito pelo crítico francês nos anos 1950; portanto, há quase sessenta anos. Nele, Barthes analisa os brinquedos franceses do período e os toma como uma reprodução do mundo adulto. O texto pode oferecer alguma dificuldade para os estudantes, mas deixe a eles – a atividade deve ser realizada em duplas – a tarefa de procurar entendê-lo.
-Em seguida, informe os alunos que, na próxima aula, eles deverão escrever um texto argumentativo analisando o papel dos brinquedos nos dias atuais, concordando ou não com as ideias de Barthes. Para ajudá-los nessa tarefa, proponha que, em casa, eles releiam e discutam o texto do filósofo com pais, irmãos mais velhos, tios ou outras pessoas da comunidade.

BRINQUEDOS
O adulto francês considera a criança como um outro eu; nada o prova melhor do que o brinquedo francês. Os brinquedos vulgares são assim, essencialmente, um microcosmo adulto; são reproduções em miniatura de objetos humanos, como se, para o público, a criança fosse apenas um homem pequeno, um homúnculo a quem só se pode dar objetos proporcionais ao seu tamanho.
As formas inventadas são muito raras; apenas algumas construções, baseadas na habilidade manual, propõem formas dinâmicas. Quanto ao restante, o brinquedo francês significa sempre alguma coisa, e essa alguma coisa é sempre inteiramente socializada, constituída pelos mitos ou pelas técnicas da vida moderna adulta: o exército, a rádio, o correio, a medicina (estojo miniatura de instrumentos médicos, sala de operação para bonecas), a escola, o penteado artístico (secadores, bobes), a aviação (paraquedistas), os transportes (trens, citroens, lambretas, vespas, postos de gasolina), a ciência (brinquedos marcianos).
O fato de os brinquedos franceses prefigurarem literalmente o universo das funções adultas só pode evidentemente preparar a criança a aceitá-las todas, construindo para ela, antes mesmo que possa refletir o álibi de uma natureza que, desde que o mundo é mundo, criou soldados, empregados do correio e vespas. O brinquedo fornece-nos assim o catálogo de tudo aquilo que não espanta o adulto: a guerra, a burocracia, a fealdade, os marcianos etc. Aliás, na realidade, não é tanto a imitação que constituí o signo da abdicação, mas sim a literalidade dessa imitação: o brinquedo francês é, em suma, uma cabeça mirrada de índios jivaro – onde se reencontram numa cabeça com proporções de uma maçã, as rugas e os cabelos do adulto.
Existem, por exemplo, bonecas que urinam: possuem um esôfago, e se lhes dá mamadeira, molham as fraldas; sem dúvida, brevemente, o leite transformar-se-á em água, em seus ventres. Pode-se, desta forma, preparar a menininha para a causalidade doméstica, “condicioná-la” para a sua futura função de mãe. Simplesmente, perante este universo de objetos fiéis e complicados, a criança só pode assumir o papel de proprietário, do utente, e nunca o do criador; ela não inventa o mundo, utiliza-o: os adultos preparam-lhe gestos sem aventura, sem espanto e sem alegria. Transformam-na num pequeno proprietário aburguesado que nem sequer tem de inventar os mecanismos de causalidade adulta, pois já lhes são fornecidos prontos: ela só tem de utilizá-los, nunca há nenhum caminho a percorrer.
Qualquer jogo de construção, se não for demasiado sofisticado, implica um aprendizado de um mundo bem diferente: com ele a criança não cria nunca objetos significativos; pouco lhes importa se eles têm um nome adulto: o que ele exerce não é uma utilização, é uma demiurgia: cria formas que andam, que rodam, cria uma vida e não uma propriedade; os objetos conduzem a si próprios, já não são uma matéria inerte e complicada na concha da mão. Mas trata-se de um caso raro: o brinquedo francês, de um modo geral, é um brinquedo de imitação, pretende formar crianças-utentes e não crianças criadoras.
O aburguesamento do brinquedo não se reconhece só pelas suas formas, sempre funcionais, mas também pela sua substância. Os brinquedos vulgares são feitos de uma matéria ingrata, produtos de uma química, e não de uma natureza. Atualmente muitos são moldados em massas complicadas: a matéria plástica tem assim uma aparência simultaneamente grosseira e higiênica, ela mata o prazer, a suavidade, a humanidade do tato. Um signo espantoso é o desaparecimento progressivo da madeira, matéria um tanto ideal pela sua firmeza e brandura, pelo calor do seu contato; a madeira elimina, qualquer que seja a forma que sustente, o golpe de ângulos demasiado vivos, e o frio químico do metal: quando a criança manipula ou bate com ela onde quer que seja a madeira não vibra e não range, produz um som simultaneamente surdo e nítido; é uma substância familiar e poética que deixa a criança permanecer numa continuidade de tato com a árvore, a mesa, o soalho. A madeira não magoa, não se estraga também; não se parte, se gasta, pode durar muito tempo, viver com a criança, modificar pouco a pouco as relações entre o objeto e a mão; se morre, é diminuindo, e não inchando com esses brinquedos mecânicos que desaparecem sob a hérnia de uma mola quebrada. A madeira faz objetos essenciais, objetos de sempre. Ora, já praticamente não existem brinquedos de madeira só possível, é certo, numa época de artesanato. O brinquedo é doravante químico, de substância e de cor; a própria matéria- prima de que é construído leva a uma cenestesia da utilização e não do prazer. Estes brinquedos morrem, aliás, rapidamente, e, uma vez mortos, não têm para a criança nenhuma vida póstuma.
BARTHES, Roland. “Brinquedos” . In: Mitologias. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999, pp. 40-42 (com cortes)

6ª etapa
-Nesta aula final, as duplas deverão redigir o texto argumentativo anunciado na aula anterior. Eles devem usar pelo menos três conjunções indicativas de relações de causa e consequência. Analise os trabalhos, faça seus comentários para cada dupla e, com base neles, peça a reescrita dos textos. O conjunto da obra pode ser transformado em uma publicação da turma ou ser exposto em murais na escola para acesso dos demais alunos.

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professores apaixonados

Professores e professoras apaixonadas acordam cedo e dormem tarde, movidos pela idéia fixa de que podem mover o mundo.
Apaixonados, esquecem a hora do almoço e do jantar: estão preocupados com as múltiplas fomes que, de múltiplas formas, debilitam as inteligências.
As professoras apaixonadas descobriram que há homens no magistério igualmente apaixonados pela arte de ensinar, que é a arte de dar contexto a todos os textos.
Não há pretextos que justifiquem, para os professores apaixonados, um grau a menos de paixão, e não vai nisso nem um pouco de romantismo barato.
Apaixonar-se sai caro! Os professores apaixonados, com ou sem carro, buzinam o silêncio comodista, dão carona para os alunos que moram mais longe do conhecimento, saem cantando o pneu da alegria.
Se estão apaixonados, e estão, fazem da sala de aula um espaço de cânticos, de ênfases, de sínteses que demonstram, pela via do contraste, o absurdo que é viver sem paixão, ensinar sem paixão.
Dá pena, dá compaixão ver o professor desapaixonado, sonhando acordado com a aposentadoria, contando nos dedos os dias que faltam para as suas férias, catando no calendário os próximos feriados.
Os professores apaixonados muito bem sabem das dificuldades, do desrespeito, das injustiças, até mesmo dos horrores que há na profissão. Mas o professor apaixonado não deixa de professar, e seu protesto é continuar amando apaixonadamente.
Continuar amando é não perder a fé, palavra pequena que não se dilui no café ralo, não foge pelo ralo, não se apaga como um traço de giz no quadro.
Ter fé impede que o medo esmague o amor, que as alienações antigas e novas substituam a lúcida esperança.
Dar aula não é contar piada, mas quem dá aula sem humor não está com nada, ensinar é uma forma de oração.
Não essa oração chacoalhar de palavras sem sentido, com voz melosa ou ríspida. Mera oração subordinada, e mais nada.
Os professores apaixonados querem tudo. Querem multiplicar o tempo, somar esforços, dividir os problemas para solucioná-los. Querem analisar a química da realidade. Querem traçar o mapa de inusitados tesouros.
Os olhos dos professores apaixonados brilham quando, no meio de uma explicação, percebem o sorriso do aluno que entendeu algo que ele mesmo, professor, não esperava explicar.
A paixão é inexplicável, bem sei. Mas é também indisfarçável.
* Gabriel Perissé é Mestre em Literatura Brasileira pela FFLCH-USP e doutor em Filosofia da Educação e doutorando em Pedagogia pela USP; é autor dos livros "Ler, pensar e escrever" (Ed. Arte e Ciência); "O leitor criativo" (Omega Editora); "Palavra e origens" (Editora Mandruvá); "O professor do futuro (Thex Editora). É Fundador da ONG Projeto Literário Mosaico ; É editor da Revista Internacional Videtur -Letras (www.hottopos.com/vdletras3/index.htm); é professor universitário, coordenador-geral da ong literária Projeto Literário Mosaico: www.escoladeescritores.org.br)