O ser humano se forma em meio a um fluxo inexorável de emoções. Cada encontro guarda um registro. Os registros iniciais vêm da família que acolhe o ser que se revela pela primeira vez ao mundo. Depois, a escola. E, na escola, os professores.
Os primeiros professores geralmente têm um preparo especial para tratar com as crianças que chegam desconfiadas diante do novo cenário, que choram por ter de deixar os pais e se assustam com um movimento qualquer que seja diferente dos de casa.
Do mesmo modo, os professores alfabetizadores possuem uma formação direcionada para esse acolhimento. Afinal, o aluno pode apresentar maior ou menor dificuldade para ler e escrever, por questões cognitivas ou de outra ordem.
No caso dos adolescentes, os educadores precisam saber que os alunos estão em um processo constante de transformação, o que lhes altera o humor, o sono e a concentração. Eles têm uma rebeldia natural que, se bem trabalhada, pode se transformar em uma criatividade impressionante.
Às vezes, os professores acreditam que o jovem não precisa do mesmo carinho e da mesma atenção dispensados à criança no processo educativo. Há muitos que na faculdade, por exemplo, decidem não se comprometer, porque pensam que os encontros são tão poucos que não compensa saber mais sobre cada aluno.
Na verdade, os professores marcam toda uma vida, positiva e negativamente. E o ser humano é tão complexo que não consegue controlar as consequências das palavras e dos gestos. Não poucas vezes, as marcas surgem de feridas abertas que os alunos têm no momento em que, sem conhecê-las, o professor toma determinada atitude. Mesmo que a intenção seja boa, falta, nessas situações, certa delicadeza e compreensão.
Os anos passam, mas as lembranças ficam. A timidez, a dificuldade de dizer alguma coisa em público e a falta de criatividade podem estar ligadas a uma escola que não se preocupou com esses “detalhes”.
Não estou dizendo que os professores sejam cruéis e que criam traumas em seus alunos; alguns machucam, invariavelmente, mas sem perceber que deixam dor. Caminham talvez distraídos e não percebem os sonhos de tantos pequenos que terão de crescer. Como afirma Rubem Alves, “a semente do pensamento é o sonho”; assim, “os educadores, antes de serem especialistas em ferramentas do saber, deveriam ser especialistas em amor: intérpretes de sonhos”.
É preciso estar atento para que as lembranças sejam mais libertadoras e menos dolorosas. Vejamos o restaurador. Há obras que são mais frágeis. Se o artista puser a mesma força em obras distintas, poderá acertar em algumas e errar grotescamente em outras. Toda obra tem suas peculiaridades, sua resistência. Deve-se conhecê-la bem antes de iniciar o processo de restauração.
Assim também o é com o educando. Cada indivíduo possui características próprias, que devem ser respeitadas. O tratamento dedicado ao aluno contribui para a formação de sua personalidade. Por isso, é importante que o professor se pergunte: “Que papel, afinal, desejo desempenhar na sociedade? O que posso agregar – a partir de minha vocação – ao meio em que vivo, a cada um destes aprendizes? Que espécie de cidadão pretendo, com meu trabalho, formar?”. De indagações como essas, nascem reflexões, descobertas e ensinamentos para toda a vida. Ou, nas palavras de Cora Coralina, poetisa goiana, “feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina”.
Texto publicado na edição de junho de 2012 da revista Profissão Mestre.
Gabriel Chalita
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