Durante seus mais de 100
anos, as histórias em quadrinhos sofreram várias mudanças. A principal delas, é
a transição de literatura inútil à ferramenta pedagógica.
Para compreender melhor, é
preciso voltar os olhos para o passado e acompanhar a evolução histórica deste
gênero literário.
Seu início foi ainda no
século XIX, mas os registros principais são do começo do século XX, com o
lançamento da revista infantil Tico-Tico (
1905 ), especializada em publicar histórias em quadrinhos. Esta revista foi
criada por Luís Bartolomeu de Souza e Silva, e era publicada em cores pela
editora O Malho. O Tico-Tico inspirada na revista francesa La Semaine de Suzette, cujo personagem principal
recebeu o nome de Felismina no
Brasil.
No princípio, os
profissionais brasileiros dedicavam-se, em maior parte, a reproduções de
histórias estrangeira, mas, havia também, personagens nacionais, como Jujuba, de Jota Carlos; Chico Muque, de Max Yantok; e Reco-Reco, Bolão e Azeitona, de Luís Sá.
Em 1934, o mercado das
revistas em quadrinhos foi impulsionado por Adolfo Aizem, ao editar o Suplemento Infantil, encarte semanal do jornal
carioca A Nação. A
publicação torna-se independente, devido ao sucesso alcançado, passando a
chamar Suplemento Juvenil,
e apresenta o primeiro personagem de história em quadrinhos brasileiro a
alcançar projeção
nacional – Roberto Sorocaba, criado por Monteiro Filho. A revista
trazia ainda histórias estrangeiras como: Flash Gordon, Mandrake,Tarzan, Popeye e Mickey. Para concorrer com o Suplemento Juvenil, o
jornalista Roberto Marinho lança “O
Globo Juvenil“, em 1937. Em 1939, é lançado “Gibi“, nome que até hoje é associado à revista de
histórias em quadrinhos. Seu primeiro número traz, entre outras histórias Lil Abner (Ferdinando), de Al Capp; César e Tubinho, de Roy Crane; e Barney Baxter, de Frank Miller. Com o sucesso do
gênero, alcançado no decorrer dos anos, surgem muitas outras revistas
especializadas em quadrinhos, como o Gibi
Mensal, oGury, o Lobinho e o Globo Juvenil Mensal, na década de 40.
Na década de 50, as histórias
em quadrinhos passam de diversão à vilãs. Nos Estados Unidos elas são acusadas
de subversão e são consideradas má influência aos jovens, sendo apontadas como
o principal fator da delinqüência juvenil e eram comumente queimadas em praças
públicas. Este efeito foi menor no Brasil, passando a serem consideradas literatura inútil, até mesmo por causa da intolerância
ideológica da época. Estes fatos, apesar de negativos, não impediram artistas
brasileiros de lançar novos personagens, como O Amigo da Onça ( 1952 ), que circulou durante
vinte anos no jornal O Cruzeiro.
Victor Civita funda a Editora
Abril e lança a primeira revista com personagens de Walt Disney no Brasil, O Pato Donald. Ziraldo lança, em 1959, Pererê, que abordava em suas histórias, temas
polêmicos, como reforma agrária e ecologia.
A década de 60 foi marcada
por um grande crescimento no mercado dos quadrinhos, devido ao sucesso de
Maurício de Souza ao lançar A Turma
da Mônica, passando a produzir revistas em série e utilizar-se
de merchandising nas vendas. Até os dias de hoje, A Turma da Mônica é a turminha mais querida dos
quadrinhos, sendo preferência entre crianças, jovens e adultos, e obteve sucesso
em vários países onde foram lançados.
Com a repressão militar na
década de 70, os quadrinhos passaram a trazer críticas sociais e políticas,
desta vez, voltados para adultos e, sofreram censura em decorrência a este
caráter crítico. Logo depois, na década de 80, o mercado se abre para artistas
como Laerte (Piratas do Tietê ),
Angeli ( Chiclete com Banana ),
Glauco ( Geraldão ) e
Fernando Gonsales (Níquel Náusea ),
voltados para o público jovem e adulto.
A crise econômica na década
de 90 afetou fortemente o mercado dos quadrinhos, fechando várias revistas
(principalmente aquelas que transformavam artistas em desenhos) e impulsionando
profissionais brasileiros a ilustrar roteiros em outros países, principalmente
nos Estados Unidos.
Após anos de conflitos, de
ser vista como literatura pouco valiosa,
as histórias em quadrinhos foram se desmitificando e, em pleno século XXI
passou a ser considerada uma poderosa ferramenta pedagógica, pois tem a
particularidade de fundir valiosas expressões culturais, como a literatura e as
artes plásticas, tornando-se uma fonte de inspiração didática.
O trabalho com as histórias em
quadrinhos é relevante, na medida em que, hoje, o quadrinho é uma forma de
expressão importante na nossa cultura, participando imensamente do universo
infantil. (GUEDES; GUIMARÃES e VIEIRA, 2004)
A qualidade destas histórias
também cresceu, como a linguagem e o enredo, contribuindo grandemente nas
aulas, sendo recomendadas até mesmo pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC)
e seus colaboradores, como Pereira (1998): Por associarem imagens e textos, os gibis ajudam as crianças a
avançar rapidamente na leitura. (PEREIRA, 1998, apud Nova
Escola On-Line)
Os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN) de Língua Portuguesa para séries iniciais do Ensino Fundamental
também abordam este tema, mas, podemos adapta-lo à Educação Infantil, pois,
para ler gibis não
é preciso saber ler. Os quadrinhos são ideais para apresentar às crianças
pré-escolares as primeiras letras, pois são coloridos, possuem textos curtos,
são facilmente encontrados e geralmente, têm preço acessível.
Ao trabalhar com histórias em
quadrinhos, o educador encontrará uma grande variedade de atividades que
poderão ser desenvolvidas com crianças com idade entre 3 e 6 anos . Para as
crianças menores, podem ser realizadas leituras em roda, deixar que elas
manuseiem as revistas e contém as histórias partindo das ilustrações. Na fase
de alfabetização, por volta dos 4 anos e meio, pode-se apagar as frases dos
balões dos personagens e pedir para que as crianças reescrevam a história, com
a ajuda do professor.
Contar histórias e separa-las
por quadros formando um quebra-cabeça e pedir para que as crianças a coloquem
em seqüência lógica é um ótimo exemplo de atividade para se desenvolver a
percepção visual e a memória. Pode-se propor à turma que criem suas próprias
histórias em quadrinhos, unindo assim, a atividade escrita e as artes
plásticas.
Vale lembrar que, assim como
os livros infantis, as histórias em quadrinhos trazem em seu conteúdo, muito
mais que diversão, muito mais do que prazer: elas trazem lições de moral,
retratam situações sociais e políticas (como as revistas da década de 70),
assuntos atuais como a inclusão, a solidariedade, meio ambiente e vêm sido
utilizadas também como meio de informação de utilidade pública, como campanhas
de vacinação, contra dengue e drogas.
Na década de 60, já se fazia
uso das histórias em quadrinhos para informação, como a história Os três mosqueteiros, desenhada por Carlos Estevão,
que trazia dicas para evitar a disseminação de mosquitos e pernilongos e Chega de Enchente, de Ziraldo, onde Pererê explicava à
população como evitar enchentes. Como possuem uma linguagem simples e
divertida, os gibis são ótimos meios de aprendizagem e conscientização, por
isso, pode-se dizer que é uma literatura que diverte e educa.
Como montar uma Gibiteca
Existem, atualmente, no país,
centenas de gibitecas públicas. A maioria delas estão instaladas em escolas do
ensino fundamental. Como foi relatado, é importante o contato da criança em
idade pré-escolar e as revistas em quadrinhos, e que o acesso a este recurso
pedagógico contribui para sua aprendizagem.
Em Mogi Mirim, as Escolas
Municipais de Ensino Fundamental (EMEF’s) já utilizam da gibiteca para prender
a atenção do aluno, principalmente daqueles que não gostam de ler. Na EMEF
Jorge Bertolaso Stella, os quadrinhos de Maurício de Souza influenciaram o
projeto pedagógico da escola, onde os alunos aprendiam com a Turma da Mônica a
preservar o meio ambiente, a respeitar as diferenças, a ser solidários, enfim a
ser cidadão.
É fácil montar uma gibiteca,
podendo até mesmo ser na sala de aula. Além de fácil, o custo para organizar um
acervo variado de gibis é baixo, podendo encontra-los em sebos e bancas de
revistas usadas. Primeiro, é preciso escolher o local, devendo ser adequado ao
tamanho da coleção, depois, é necessário cataloga-los e sapará-los por título e
gênero ( infantil, super-herói, humor, ficção, etc. ), criar, juntamente com as
crianças, regras de manuseio, empréstimo e conservação dos exemplares,
organização das prateleiras, etc.
Se a escola não dispõe de
espaço, o educador pode organizar uma gibiteca desmontável, onde as revistas são guardadas em uma
caixa e, na hora combinada para a leitura, o professor faz uma roda com os
alunos e expõe os gibis no centro desta roda e cada um escolhe o que mais lhe
agrada. Os gibis confeccionados na sala de aula também devem fazer parte da
coleção, assim as crianças irão se sentir parte integrante e ativa na gibiteca.
O professor pode organizar, também, o dia
do gibi, onde cada criança leva um gibi que gostou de ler e o
empresta para os colegas de classe, depois, trocam informações e comentários
sobre as histórias.
Como podemos ver, as revistas
em quadrinhos também são uma fonte de aprendizagem e diversão, com baixo custo
e grande variedade. Com imaginação, o educador poderá montar grandes projetos
pedagógicos com histórias em quadrinhos para aplica-los aos alunos, que, mesmo
com pouca idade, já manifestam seus gostos e preferências e são muito capazes
de repassar as lições que aprendem na escola para quem estiver disposto a
escutá-los.
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