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quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

A formação do (bom) professor


   No final dos anos 1990 e início da década de 2000, comissões do Ministério da Educação (MEC) concluíram que a baixa qualidade da educação nacional era causada pela formação dos professores. Para estabelecer padrões de qualidade sobre este aspecto, o governo federal publicou, em 2002, as Diretrizes Nacionais para Formação de Professores. Com projeto centrado no aluno do futuro docente, esses profissionais da educação teriam de ter competências no domínio de conteúdos, de técnicas pedagógicas, processos e metodologias de investigação.
Mas para Carlos Bauer de Souza, professor do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação da Universidade Nove de Julho, de São Paulo (SP), a profissão desinteressante não atraiu jovens para a docência e não há sequer como fazer uma análise dessa formação, simplesmente porque falta professor. “A precarização da carreira torna o debate sobre a formação do professor até certo ponto secundário, pois falta gente que atue na realidade da escola e tenha condições de fornecer subsídios para a melhoria, para realizar a crítica e sugestões”, analisa.
Souza acredita que a publicação da Política Nacional para Formação de Professores, em 2009, foi uma tentativa de trazer a credibilidade da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) para a especialização e aperfeiçoamento dos docentes. “Não houve muita modificação em relação às diretrizes. A Capes já era reconhecida no seu trabalho com a pós-graduação stricto sensu e assumiu essa responsabilidade. Ficou claro que o governo colocou a estrutura, formação e financiamento da formação do professor como uma obrigação do Estado”, avalia.
No entanto, para Souza – que também foi um dos elaboradores do programa educacional da campanha do então candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva, em 1989 –, mesmo sem uma base sólida para a avaliação tanto das diretrizes quanto das políticas de formação é possível afirmar que elas desconsideram a realidade social, econômica e política a que os professores estão submetidos nos Estados como um elemento central da sua formação. “Houve uma grande valorização do ensino público federal. As instituições reestruturaram departamentos, aumentaram vagas, salários e patrimônio. Mas nos Estados, mesmo os mais ricos, as condições de trabalho e salário não são estimulantes para mobilizar uma parcela considerável da juventude em direção aos cursos de formação de professores”, afirma. Para ele, a exceção são os cursos de Pedagogia, especialmente pela grande quantidade de docentes de séries iniciais que atuavam nos sistemas de ensino sem ter curso superior, uma herança dos antigos cursos de magistério em nível médio. “Por isso, até a média de idade dos alunos desse curso não é a mesma da verificada em licenciaturas”, explica.

Preparo técnico precário
Com o argumento de que os cursos de Pedagogia e licenciaturas têm excesso de carga horária destinada à teoria e pouca formação didática, uma corrente de pesquisadores faz críticas à distribuição das aulas práticas e propõe mudanças na formação do professor brasileiro.
Segundo a consultora educacional Guiomar Namo de Mello, diretora da Escola Brasileira de Professores (Ebrap) e ex-secretária de educação do município de São Paulo, os cursos são excessivamente “psicologizados” e não ensinam como o professor vai lidar com os alunos, com a vida real. Para a educadora, as turmas da educação básica são muito diversas, com características que a escola não controla – como origem social, econômica e formação familiar –, mas a única variável controlável, que é o professor, não aprende a gerenciar o processo educacional. “Ninguém ensina ao futuro professor a gestão de espaço, tempo e vínculos. Ele tem que aprender, depois de entrar na sala de aula, a administrar o processo de ensino e aprendizagem. Na faculdade, não aprende a verificar se domina realmente o que será ensinado e se tem conhecimento sobre a própria criança e suas condições de vida. Não vê na sua formação como organizar o tempo e o espaço de aula que lhes são dados”, avalia.
Bernadete Gatti, pesquisadora da Fundação Carlos Chagas e consultora da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), lembra que os professores são o terceiro maior grupo de trabalhadores do Brasil, com um total de 2,5 milhões de pessoas, atrás apenas de escriturários e trabalhadores não qualificados. Como função em que é exigido o nível superior, a profissão é a maior do País. “Esperamos que médicos façam diagnósticos e tratamentos corretos, por exemplo. No caso do professor, a relação é a qualidade da educação básica, que por sua vez é ligada à formação profissional e ao valor social da profissão”, analisa.
Segundo Bernadete, o valor social da educação não é alto no Brasil, o que se construiu historicamente com a finalidade das instituições de ensino e da própria formação profissional. “A escola não tem atendido às necessidades da sociedade, mas hoje não se sabe qual é a finalidade da educação”, afirma.
A pesquisadora acrescenta que o profissional sabe o que fazer quando sabe o porquê. “Em outros momentos históricos se sabia que [a educação] era parte de projeto de nação, modernização, industrialização do País ou formação de mão de obra. Mesmo que sejam questionáveis, havia consenso. Hoje há gente que acredite ser apenas ensinar a ler e escrever. Estamos numa crise de finalidade. Nenhum projeto ou lei lida com essa questão”, avalia.
De acordo com Bernadete, a falta de definição resulta na falta de orientação ao trabalho do professor, o que em outras instâncias da sociedade também gera a sensação de que a docência é algo comum, que qualquer pessoa pode executar, e que não há necessidade de uma formação qualificada para exercê-la. Nesse “cada um por si”, os pais querem formar o filho simplesmente para que este consiga um emprego. “Enquanto outras profissões caminham para uma formação inicial mais densa, as licenciaturas e os cursos de Pedagogia estão no caminho inverso. Tudo isso tem influência no valor social, nas políticas para a educação básica e nas políticas relativas à docência”, alerta.

Desafios na formação
Uma equipe da Fundação Carlos Chagas, liderada por Bernadete Gatti, levantou como se dá a formação de docentes em cursos de Pedagogia e nas licenciaturas com maior número de aulas (Língua Portuguesa, Matemática e Ciências Biológicas). A estrutura da formação se mostrou ineficiente para fornecer aos sistemas de ensino profissionais que saibam trabalhar conhecimentos de modo contextualizado, em diferentes culturas e características dos grupos de alunos e instituições.
Segundo o estudo, a construção de repertório de conhecimentos básicos sobre como se colocar numa sala de aula é praticamente inexistente. “Nenhum currículo que avaliamos nos cursos de Pedagogia tratava disso. Em todo o País, encontramos 3.107 disciplinas diferentes. É muito disperso, ninguém sabe o que o professor realmente faz, cada um organiza do modo que acha melhor”, revela Bernadete.
A análise das ementas das disciplinas de formação específica (Metodologia, Prática e Didática de Ensino) mostrou predomínio de abordagens sem ênfase em práticas pedagógicas. Elas também correspondem a 30% da carga horária dos cursos de Pedagogia. Embora isso seja considerado desproporcional, o equilíbrio na formação é defendido na pesquisa com aumento de carga horária dos cursos, e não por substituição de aulas teóricas por práticas didáticas. “Os estágios de docência, que poderiam corrigir as deficiências, são feitos sem muito controle. O recém-formado vai para a rede de ensino no sacrifício. Verificamos um concurso com 25 mil vagas para professores de uma rede estadual. A prova exigia fundamentos e metodologia de ensino. Apenas 1.232 dos 30 mil candidatos foram aprovados”, acrescenta Bernadete.
A situação nas licenciaturas não se mostrou diferente. Nos cursos da área de Ciências Biológicas, por exemplo, menos de 5% do conteúdo é voltado à prática de ensino. “Esses cursos copiam o projeto pedagógico do bacharelado e não são voltados para a formação do professor. Formar um biólogo é diferente de formar um professor de Biologia”, exemplifica.

Cursos a distância
De acordo com o levantamento da Fundação Carlos Chagas, em 2011, 58% dos formados em Pedagogia saíram de cursos oferecidos a distância. O uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) facilita o acesso, e muitas instituições de ensino superior as utilizam para reduzir custos do “serviço” e oferecer preços mais competitivos aos seus “clientes”. Contudo, essa forma de uso das TICs tem se mostrado equivocada e sem controle adequado dos órgãos públicos responsáveis pela fiscalização e autorização, pois há instituições que fecharam turmas presenciais por conta de custos para substituí-las por cursos à distância.
Segundo Bernadete, há movimentos dentro do próprio Ministério da Educação (MEC) que defendem a formação essencialmente presencial, com o formato a distância apenas para mediação, nunca para formação inicial. Por outro lado, o Conselho Nacional de Educação (CNE), que é órgão consultivo do MEC, autoriza esses cursos. “É uma modalidade cara, que exige manutenção dos equipamentos, polos equipados e material com uma linguagem diferente do que se ensina no [curso] presencial. A impressão é que se faz de qualquer jeito. Não é à toa que no ano passado o MEC fechou 832 polos porque não tinham tutores qualificados, insumos e materiais adequados”, completa a pesquisadora.

Histórico da formação de professores no Brasil
1549-1759 – Jesuítas ensinavam os princípios e a cultura do cristianismo às crianças indígenas de forma oral.
1760 – Desmantelada a estrutura jesuítica, instituiu-se a educação voltada ao progresso científico e à difusão do saber.
1827 – Lei da Educação Elementar estabelece exames de proficiência no método de ensino para seleção de “mestres e mestras”.
1830 – Criação do curso normal para professores.
1834 – Estabelecimento de escolas baseadas no modelo francês. Professores recebiam materiais pedagógicos em método intuitivo.
1890 – Reforma republicana apontava insuficiência quantitativa e qualitativa dos mestres.
1891 – Instituída a educação média e superior nos Estados.
1930 – Papel social da escola é preparar mão de obra. Formação primária dada por professores formados em cursos equivalentes ao nível médio.
1945 – Instituído sistema nacional de ensino para auxiliar a industrialização acelerada. Modelo Paulista serviu de referência para o restante da nação.
1971 – Formação de docentes de educação infantil à 4ª série se dá em nível profissionalizante no 2º grau (antigos cursos de magistério). Para os demais níveis se exigem licenciaturas e Pedagogia.
1988 – Estabelece-se a educação como direito social e obrigatoriedade do Estado e da família até a conclusão do 1º grau.
1996 – Regulamentação de educação especial e instituição da obrigatoriedade de curso superior para professores de todos os níveis.
1998 – Alguns Estados oferecem bolsas de pós-graduação stricto sensu para professores da rede pública.
2000 – Programas de formação continuada são implantados em sistemas públicos.
2002 – Publicação das Diretrizes Nacionais para Formação de Professores.
2002 – Aprovação dos cursos de Pedagogia e licenciaturas a distância.
2009 – Publicação das Políticas Nacionais de Formação de Professores.
2010 – Universidade de São Paulo abre curso de Pedagogia totalmente a distância.
2011 – MEC cria a Prova Nacional de Concurso para Ingresso na Carreira Docente para subsidiar redes estaduais e municipais em concursos para contratação de professores da educação básica. A previsão é de que a aplicação da prova ocorra no segundo semestre de 2012.

Exemplo do perfil de calouros
A revista Profissão Mestre realizou um levantamento com uma turma de 1º semestre de Pedagogia do Centro Universitário Estácio Radial de São Paulo. Ao todo, 28 estudantes responderam a questionários com questões optativas. Nesse universo, 96,4% são mulheres. Veja mais detalhes sobre esse público:
Os sistemas públicos formaram 80,8% no ensino fundamental e 76,9% no ensino médio (12,5% cursaram Educação de Jovens e Adultos)
Apenas 7,7% dos pais e 3,8% das mães desses estudantes cursaram nível superior.
Renda familiar média é de R$ 2.928,96, mas 56% da amostragem vivem em lares que dispõem de menos de R$ 2 mil/mês.
Os planos para a carreira indicam que 43,8% preferem atuar como docentes, 31,2% querem a direção/gestão escolar e 15,7% preferem coor­denação pedagógica em detrimento da sala de aula.
56,1% relataram que escolheram o curso para ajudar pessoas a melhorar de vida, desenvolver o País, melhorar o futuro das crianças e o sonho de construir algo melhor para o próximo.
Uma aluna com mais de 45 anos de idade respondeu que havia escolhido o curso por julgar mais fácil encontrar emprego na sua idade.

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professores apaixonados

Professores e professoras apaixonadas acordam cedo e dormem tarde, movidos pela idéia fixa de que podem mover o mundo.
Apaixonados, esquecem a hora do almoço e do jantar: estão preocupados com as múltiplas fomes que, de múltiplas formas, debilitam as inteligências.
As professoras apaixonadas descobriram que há homens no magistério igualmente apaixonados pela arte de ensinar, que é a arte de dar contexto a todos os textos.
Não há pretextos que justifiquem, para os professores apaixonados, um grau a menos de paixão, e não vai nisso nem um pouco de romantismo barato.
Apaixonar-se sai caro! Os professores apaixonados, com ou sem carro, buzinam o silêncio comodista, dão carona para os alunos que moram mais longe do conhecimento, saem cantando o pneu da alegria.
Se estão apaixonados, e estão, fazem da sala de aula um espaço de cânticos, de ênfases, de sínteses que demonstram, pela via do contraste, o absurdo que é viver sem paixão, ensinar sem paixão.
Dá pena, dá compaixão ver o professor desapaixonado, sonhando acordado com a aposentadoria, contando nos dedos os dias que faltam para as suas férias, catando no calendário os próximos feriados.
Os professores apaixonados muito bem sabem das dificuldades, do desrespeito, das injustiças, até mesmo dos horrores que há na profissão. Mas o professor apaixonado não deixa de professar, e seu protesto é continuar amando apaixonadamente.
Continuar amando é não perder a fé, palavra pequena que não se dilui no café ralo, não foge pelo ralo, não se apaga como um traço de giz no quadro.
Ter fé impede que o medo esmague o amor, que as alienações antigas e novas substituam a lúcida esperança.
Dar aula não é contar piada, mas quem dá aula sem humor não está com nada, ensinar é uma forma de oração.
Não essa oração chacoalhar de palavras sem sentido, com voz melosa ou ríspida. Mera oração subordinada, e mais nada.
Os professores apaixonados querem tudo. Querem multiplicar o tempo, somar esforços, dividir os problemas para solucioná-los. Querem analisar a química da realidade. Querem traçar o mapa de inusitados tesouros.
Os olhos dos professores apaixonados brilham quando, no meio de uma explicação, percebem o sorriso do aluno que entendeu algo que ele mesmo, professor, não esperava explicar.
A paixão é inexplicável, bem sei. Mas é também indisfarçável.
* Gabriel Perissé é Mestre em Literatura Brasileira pela FFLCH-USP e doutor em Filosofia da Educação e doutorando em Pedagogia pela USP; é autor dos livros "Ler, pensar e escrever" (Ed. Arte e Ciência); "O leitor criativo" (Omega Editora); "Palavra e origens" (Editora Mandruvá); "O professor do futuro (Thex Editora). É Fundador da ONG Projeto Literário Mosaico ; É editor da Revista Internacional Videtur -Letras (www.hottopos.com/vdletras3/index.htm); é professor universitário, coordenador-geral da ong literária Projeto Literário Mosaico: www.escoladeescritores.org.br)